Exposições 2017

"A luz que vela o corpo é a mesma que revela a tela"

Curadoria: 

Bruno Miguel


Coletiva


CAIXA Cultural - Rio de Janeiro, RJ, Brasil


2017

08 de março até 24 de maio

Artistas Participantes

Alan Fontes

Alexandre Mury

Alvaro Seixas

Ana Elisa Egreja

Ana Prata

Bruno Belo

Bruno Dunley

Bruno Vilela

Caio Pacela

Camila Soato

Dalton Paula

Eder Oliveira

Fabio Magalhães

Gabriel Secchin

Gisele Camargo

Gustavo Speridião

Julia Debasse

Makh Hanamakh

Marcelo Amorim

Marcone Moreira

Mariana Leico

Mariana Palma

Marina Rheinghantz

Paloma Ariston

Paulo Almeida

Paulo Nimer Pjota

Pedro Varela

Rafael Alonso

Rafael Carneiro

Rodrigo Martins

Rodrigo Torres

Sidney Amaral

Thiago Martins de Melo

Victor Mattina

Vitor Mizael

Texto curatorial


Obras de arte não podem mudar o mundo, mas podem mu- dar pessoas.


Seria ingênuo acreditar que hoje, num tempo de excessos, uma obra sozinha poderia ser o estopim de uma revolu- ção, política, social, moral ou espiritual. Pelo menos não de maneira direta e linear. E, no caso da pintura então, al- gum pintor teria, em 2016, a expectativa sincera de que seu trabalho possa implodir sistemas? Porém todo artis- ta, do mais pragmático e profissional ao mais romântico e utópico, guarda dentro de si um segredo e nem sempre de forma consciente. Uma sensação de divindade intelectual, um sentimento de invenção que o faz crer ser capaz de co- mover, impactar, transformar e fazer pensar aqueles que se permitirem adentrar suas obras e suas ideias.


A pintura não vai mudar a sociedade, mas continuará pre- tensiosa. Uma observadora por vezes silenciosa, mas difi- cilmente indiferente a tudo que a cerca. Sua essência quase ritualística lhe confere algo de sagrado, que a sublima e a protege como numa área vip, no camarote da produção de imagens da pós-modernidade. O tempo de maturação de um artista não acompanha a velocidade de produção de conteúdos da contemporaneidade. É um outro tempo, pa- ralelo à vida.


O conceito de aura, apropriado por Walter Benjamin, é definido como "uma figura singular, composta de elemen- tos espaciais e temporais: a aparição única de uma coisa distante, por mais perto que ela esteja." Tal conceito com- preende, basicamente, três noções relativas à obra de arte: originalidade, autenticidade e unicidade, que correspon- dem a certos princípios. Em relação ao princípio do "aqui e agora", "hic et nunc", são considerados a presença física e o local de origem que garantem a unicidade da obra de arte, que também se relaciona à sua duração material, sua inserção na tradição e seu testemunho histórico. Também está diretamente ligada a uma ideia religiosa de aura, dando à obra de arte um caráter de objeto a ser cultuado. Ou seja, o conceito de aura diz respeito, basicamente, a uma exis- tência única da obra de arte; portanto, concluí-se que ela não existe em uma reprodução. A pintura transborda aura!


Essa condição permite que a pintura, como objeto físico, ainda resista frente à efemeridade da produção de imagens e conteúdos virtuais, mecânicos, comerciais e industriais. E, como imagem, se aproveite das possibilidades de circu- lação que as novas redes proporcionam. Alcançando assim horizontes mais distantes que as paredes dos museus ou dos livros de arte.


Nossa mostra é dividida em nove "temas", cada um com um grupo de obras selecionadas de quatro pintores, que têm em comum o fato de terem suas pesquisas desenvolvidas e afirmadas após o surgimento da internet. E esse não é um dado conceitual de suas obras, mas sim um recorte cura- torial para investigar um momento específico da história, mais que da arte, do mundo. Em cada tema, na escolha das obras e artistas, as questões se apresentam muito mais a partir de contrastes e contradições do que de afinidades. Como num jogo de interfaces contemporâneas, o ritmo da exposição se desenha nos processos híbridos de criação.


Esta exposição pretende mostrar como a pintura é pen- samento contaminado pelo seu tempo e como prossegue viva comentando as questões do mundo contemporâneo. Para Michel Foucault, todas as lutas são igualmente cen- trais, porque cada um de nós é o centro de sua própria vida, porque a vida social é dispersa e, como não há hierarquia na política, as lutas são equivalentes. Portanto é preciso ser sempre combativo e vigilante. Essa generosidade é um dos princípios da pintura na contemporaneidade. Questões globais, regionais, individuais, sociais, técnicas, de lingua- gem, banais ou superficiais têm o mesmo direito de aten- ção. Muita atenção. Mas, esse agradável fardo, a pintura há de continuar levando. O tempo da pintura corre desacele- rado, mas sincronizado com o resultado da equação atelier / mundo. A pintura persiste afirmando nas entrelinhas, nо subjetivo, na poesia conceitual que a imagem pura não é capaz de comportar.


A sombra trêmula da caverna de Platão, a mesma projetada pela vela de um velório, que reza o corpo agora sem alma, mas ainda carregado de aura. Essa luz inconstante, mas sagrada, é a mesma que revela a tela. É uma luz que refle- te o presente, relembrando o passado e aguardando que o amanhã possa ser um pouco melhor.


BRUNO MIGUEL

curador