Videoperfomance

"Lisa", 2013 (videoarte)

Photography/ Script / Director: Alexandre Mury | Music: Antonio Vivaldi – “La Stravaganza” – Concerto No. 2 RV279 


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A vida dos Artistas [trecho]

 por Giogio Vasari 

Leonardo fez, para Francesco del Giocondo, o retrato de Monalisa, sua esposa, trabalhou quatro anos nele, e deixou inacabado.  Esta obra, hoje, está com o rei Francisco da França, em Fontanebleu.  Quem quiser ver até que ponto a arte consegue imitar a natureza. Poderá compreende-lo facilmente observando aquele semblante. Pois nele estão reproduzidas todas as minúcias que é possível pintar com sutileza.  Os olhos têm o brilho e a umidade que se costumam ver nos seres vivos, e em torno deles percebem-se zonas lívidas e rosadas, assim como pelos, coisas que não é possível fazer sem muita sutileza.  Os cílios, representados no modo como nascem na carne, ora mais densos, ora mais ralos, obedecendo ao giro dos poros, não poderiam ser mais naturais. O nariz, com aquelas belas narinas róseas tenras, parece estar vivo. A boca, cuja fenda termina em cantos de um vermelho que une à carnação do rosto, na verdade, não parece feita de tintas, mas de carne. Na base de seu pescoço, quem olhar atentamente verá a pulsação das artérias: pode-se dizer que essa pintura foi feita de uma maneira capaz de causar medo e temor a qualquer artista valente, fosse ele qual fosse.  

Leonardo valeu-se do seguinte artifício, Enquanto retratava a Mona Lisa, que era belíssima, por perto sempre havia pessoas a tocar ou cantar, bem como bufões que a mantinham alegre, para eliminar aquela melancolia tão frequente na pintura e nos retratos que se fazem. E, nesse retrato feito por Leonardo, há um sorriso tão agradável que mais parece coisa divina que humana, tão admirável por não ser diferente do natural.


GIORGIO VASARI    "Vidas dos mais excelentes arquitetos, pintores e escultores italianos, de Cimabue até nossos dias" (título original).

Lisa | 2013

Obra: Lisa, ano:2013, artista: Alexandre Mury, autorretrato perfomático, releitura da Mona Lisa
Fotografia    Autorretrato performático

Arte Multimédia

Interdisciplinaridade e Transdisciplinaridade 

O corpo e o hibridismo das linguagens

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Lisa e Jocosa

Declaração do artista


Não é comum acontecer assim, mas a minha versão da Gioconda veio de um sonho. Acordei e anotei a ideia. Fiquei por muitos anos resistindo para não realizar este trabalho, por achar que a releitura deste ícone já estava banalizado. Eu não estava encontrando nada que pudesse argumentar a possível "releitura". E aconteceu, involuntariamente, sonhando — um embate com o surreal, algo que remetia a um autoflagelo e automutilação, mas também, à autorregeneração. Seriam insights espontâneos para realizar uma obra com a vertente do  body art.


Andei lendo exaustivamente inúmeras teorias e especulações em torno do retrato mais conhecido do mundo — aquele monte de informação perturbou meu sono. A minha vontade era superar julgamentos genéricos que aprisionam as releituras na ideia limitada de "tableau vivant"; eu me aproprio de uma referência compositiva, faço um diálogo com esse registro do passado, com a intensão, de trazer questionamentos contemporâneos. Embora, este esforço não seja necessário.  


We often invent the future out of fragments from the past.  —  Erwin Panofsky.


Quando, na adolescência, eu pintava, gostava tanto de tinta que me sujava de propósito. A minha maturidade artística veio quando eu fui me permitindo, cada vez mais, experimentações e entregas. Por vezes, apareço com o corpo pintado — Eu sempre quis entrar no quadro. Meu corpo é o meu objeto de trabalho, minha alma imersa na fotografia é um desejo de experiência prazerosa. Porém, a cada obra nova, eu me abandono, me recrio como pessoa, isso me causa algum sofrimento — é um desapego. A experiência de se colocar no lugar do outro é o que, de mais especial, tem no meu trabalho. Pouco me importa quem foi a Mona Lisa, mas estou ali caracterizado de mulher — O que é ser mulher? — O que é ser homem? — O que é "ser"? — Quem eu sou? — Somos artífices de nós mesmos? — As aparências enganam? — O que é cópia? — O que é originalidade? 


A beleza é deslocada daquilo que eu vejo para aquilo que eu não vejo. O bom apreciador de arte não se contenta com o que vê. O próprio Leonardo da Vinci disse « La pittura e cosa mentale » "L' Arte e cosa mentale". Não consigo evitar a citação de outras obras em um só trabalho. Um olhar mais atento de expectador perscrutador poderá enxergar muito mais do que aquilo que declaro ou deixo tácito.


"(...) a arte do passado é arte, no sentido pleno da palavra, enquanto, ainda, está presente, que ainda, fertiliza e inova. Quando efetivamente se torna um mero passado, perde sua eficácia estritamente estética e sugere emoções de substância arqueológica. Sem dúvida, estes são o motivo de grande prazer; mas não pode ser confundido ou substituído pelo próprio prazer estético. A arte do passado não é 'arte', 'foi' arte" (ORTEGA, 1970, p. 74).


Ao Realizar uma 'performance' me depilando, diante de uma câmera e um espelho, fui transmutando multifacetado em um espetáculo com o propósito claro de assuntar a temporalidade.  Foi a primeira obra que resolvi conceber 'videografada'. Muitas pessoas disseram que era o make of da fotografia. Esta empreitada resultou, também, em uma fotografia.  Tanto o video, quanto a fotografia tem o título de "Lisa" (trocadilho jocoso), embora tenha sido tão sofrido. Portanto, acredito que a confusão entre o documental e o dramático na 'videoperfomance' seja legítima.


O meu primeiro interesse pela arte, desde a infância, começou pelos autorretratos. A minha mãe ensinou-me, aos 3 anos, a contornar a mão, com um lápis, e obter o desenho incrível de uma parte de mim. Por isso, gosto de lembrar de uma alegoria do autorretrato, feito pelo Giorgio Vasari, demonstrando um artista contornando a própria sombra na parede.  Mas naquela idade eu era chamado de "meu Van Gogh", pela professora do jardim de infância (tia Dolores).  Eu sentia orgulho, pela distinção e comparação, todavia, mais tarde, na adolescência, fiquei assombrado ao saber da história da orelha. Cabe, agora, situar outra referência importante como a Frida Khalo, que tanto retratou a autoimagem e se torna outro artista influente na minha formação.


Mira que si te quise fue por tu pelo, ahora que estás pelona ya no te quiero.  


Um turbilhão de referências está o tempo todo reconfigurando projeções indisciplinadas. Contudo, jamais diria: aleatórias. De História da Arte a Teorias Diversas, de Memórias Afetivas a Especulações Vulgares... se eu misturo a cena da navalha no olho vista em "O Cão Andaluz", com a remoção das sobrancelhas da Mona Lisa em uma limpeza mal sucedida da pintura e o retrato da Frida cortando os cabelos eu me vejo em um processo desencadeador de ideias que não é organizado e heurístico.  Entre desaparecimentos e adulterações da Mona Lisa, revê-la é relê-la inevitavelmente.



Alexandre Mury, Brasil, outubro, de 2022
O Estúdio do Artista, Jan Vermeer

O Estúdio do Artista, 1665

Jan Vermeer


Autorretrato com cabelo cortado, Frida Kahlo

Autorretrato com cabelo cortado, 1940 Frida Kahlo


Autorretrato, Giorgio Vasari

Autorretrato, 1561-1569

Giorgio Vasari


Mona Lisa, de Sofie Matisse, a obra remete apenas ao cenário da Mona Lisa de Da Vinci. Nesta obra a Mona Lisa está ausente na cena.

Mona Lisa,1997

Sofie Matisse


Obra: Mona Lisa, autor: Leonardo Da Vinci

Título: Retrato de Mona Lisa, Portrait of Lisa Gherardini, wife of Francesco del Giocondo, known as "Monna Lisa, la Gioconda" or "Mona Lisa", 1503-1519

Criador: Leonardo di ser Piero DA VINCI, dit Léonard de Vinci (1452 - 1519), Paris, musée du Louvre


Mona Lisa ("Senhora Lisa") também conhecida como A Gioconda (em italiano: La Gioconda, "a sorridente"; em francês, La Joconde) ou ainda Mona Lisa del Giocondo ("Senhora Lisa esposa de Giocondo") 


Saiba + em:

Louvre 

Data de criação: 1503/1519

Local de criação: Florence, Italie

Dimensões físicas: 77 x 53 cm.

Meio: Oil on canvas

Idioma original: French

Procedência: France, Paris, musée du Louvre-Acquis par François Ier en 1518.

Fonte original: Paris, Louvre Museum

Direitos: France, Paris, musée du Louvre-Acquis par François Ier en 1518. Photo © RMN-Grand Palais (musée du Louvre) / Michel Urtado

Capa do livro: Vidas dos artistas, autor: Giorgio Vasari

Vidas dos artistas

Autor: Giorgio Vasari

Tradutor: Ivone Castilho Benedetti 

Editora ‏: ‎ WMF Martins Fontes - POD; 1ª edição (9 dezembro 2020)

Idioma: ‎ Português

Capa comum ‏ : ‎ 856 páginas

ISBN-10: ‎ 6586016355

ISBN-13: ‎ 978-6586016352

Dimensões‏: ‎ 24 x 17.2 x 4.4 cm

Publicado pela primeira vez em Florença em 1550, este livro é considerado a obra inaugural da história da arte e fonte escrita indispensável para quem quer se familiarizar com a arte do Renascimento italiano e seus protagonistas. Vasari, pintor e arquiteto, nos oferece o relato das biografias dos mais célebres artistas do Renascimento italiano. A esta edição, com prefácio de Giovanni Previtalli e organização e notas de Luciano Bellosi e Aldo Rossi, que reproduz integralmente a edição de 1550, se acrescentam um índice de nomes e outro de lugares e obras que facilitam a localização das obras a que Vasari faz referência. 


Estúdio do artista 

O artista Alexandre Mury em seu estúdio, preparando o cenário para o videoperfomance "Lisa". O artista pinta uma tela que servirá de fundo para a cena.

Outras releituras famosas

Releitura da Mona Lisa com bigode feita por Duchamp

Marcel Duchamp, L.H.O.O.Q, 1964


“Quando o Dada estava a todo vapor e estávamos demolindo muitas coisas, a Mona Lisa se tornou a principal vítima. Coloquei um bigode e um cavanhaque no rosto simplesmente com a ideia de profaná-la." — Marcel Duchamp 
Releitura da Mona Lisa feita por Rubens Gerchman

Mona Lou, Rubens Gerchman, 1975


Serigrafia inspirada por uma personagem real, Maria de Lourdes de Oliveira, a Lou, que causou furor naquela década ao matar um ex-namorado, a obra mistura a tela A Negra, de Tarsila do Amaral, e a Mona Lisa, de Leonardo da Vinci.
Releitura da Mona Lisa volumosa de Fernando Botero

Fernando Botero - Mona Lisa, 1977


As figuras volumosas fazem parte da identidade estética do artista colombiano. A releitura bem humorada da Mona Lisa permanece com a mesma posição e o semelhante sorriso enigmático. O artista desde o início da carreira nos 1950s dedicava-se a criar a suas próprias versões de obras famosas. 
Releitura da Mona Lisa feita por Basquiat

Jean-Michel Basquiat, Mona Lisa, 1983 


O artista realiza esta releitura associando a Monalisa com a conhecida imagem de George Washington estampada nos dólares americanos. Dessa forma, o artista enfatizou o status da arte contemporânea como uma espécie de moeda.

Pesquisa e referências   —   👁 

 'La Joconde' du Louvre tem sobrancelhas e cílios quase imperceptíveis, que poderiam ter sido apagados em cada limpeza realizada na pintura.

Recorte da imagem, apenas para o detalhe dos olhos da Mona Lisa evidenciando a ausência de sobrancelhas.

É o retrato mais famoso do mundo, o de Mona Lisa, esposa do comerciante de tecidos florentino Francesco del Giocondo, apelidado de “Gioconda” afrancesada La Joconde. Pintada em frente a uma paisagem distante, a Mona Lisa olha para nós, seu lendário sorriso nos lábios. Mas, além de sua expressão, é a técnica do sfumato que lhe confere essa presença particular: Leonardo da Vinci sobrepôs finas camadas de tinta para criar formas enquanto atenua contornos e contrastes. O artista captura o momento em que Monna Lisa se volta para o espectador. É esse movimento tão natural que dá uma impressão de vida à pintura.

Em 21 de agosto de 1911, o pânico eclodiu no Louvre... a Mona Lisa havia desaparecido! A notícia se espalhou como fogo e recompensas generosas foram prometidas para seu retorno – mas tudo em vão. Nada foi ouvido sobre a pintura por mais de dois anos. Então, um dia, Vincenzo Peruggia, um vidraceiro que trabalhou no Louvre, tentou vender a pintura mais famosa do mundo para um negociante de arte italiano... que alertou as autoridades. Assim, a Mona Lisa foi recuperada – e sua fama foi ainda maior.


Saiba +

Louvre

Museu del Prado



'La Gioconda' del Prado foi pintada por um discípulo de Leonardo em seu estúdio. Especialistas dizem que foi pintado ao mesmo tempo que o original. 

A Mona Lisa com sobrancelhas evidenciadas no recorte da imagem mostra o detalhe da pintura  realizado por um assistente de Leonando Da Vinci.

Pascal Cotte, um engenheiro francês, em outubro de 2007, diz ter descoberto, utilizando uma câmera de alta definição, que Leonardo da Vinci fez originalmente sobrancelhas e pestanas, na pintura da Mona Lisa. Ampliado o rosto de Mona Lisa 24 vezes, Cotte diz ter encontrado resquícios de pinceladas acima dos olhos que representam cílios e sobrancelhas.


Repercussão 

Obra importante para compreender o processo criativo obteve relevância para o debate crítico da trajetória do artista .

Alexandre Mury diante de sua obra, Lisa. O artista segura um jornal com a página onde sua obra foi estampada quase na página inteira para ilustrar a matéria sobre a sua exposição de arte.
Clipping de mídia, matéria do Segundo Caderno, Caderno de cultura, sobre as obras e o Alexandre Mury
TAM NAS NUVENS - pág. 82 - Ano 6, N.68 - agosto 2013 
Alexandre Mury na TV PUC - Rio | Programa 'Antena Coletiva'

"Antena Coletiva"programa do dia 23/08/2013[ A matéria aparece a partir do minuto 10m30s ] 
Catraca Livre
A mostra Virei Viral esteve  em cartaz no Centro Cultural Banco do Brasil    abordou o impacto das tecnologias digitais na forma como criamos, consumimos e distribuímos conteúdos, inclusive a arte. A exposição contou um pouco da história dos virais desde os tempos pré digitais até as novas e futuras tecnologias. Alexandre Mury foi um dos artistas convidados para exibir alguns de seus trabalhos que destacaram-se com o número de compartilhamentos nas redes sociais. O Abaporu, a Mona Lisa e o Ganímedes são as obras presentes.